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Unsatisfashion 2

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ORIGINALIDADEtradição_inovaçãonúmero dois.artesanato_solidáriobrazilian_bikinicópia_originalidadeN.2 - MAI/AGO 2020

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3editorialUNSATISFASHION ORIGINALIDADEOs últimos quatro meses foram intensos. A pandemia transfor-mou – provavelmente de forma denitiva –, nossa rotina e trabalho em Milão. Aproveitamos o momento para aprimorar o conteúdo da Fashion For Future em diversas mídias e solidicar nossa presen-ça online. Apesar do isolamento social, novas relações promissoras se estabeleceram em diversas colaborações, nos programas de for-mação e nas masterclasses oferecidas gratuitamente às instituições brasileiras. Crescemos tanto que nem foi tão difícil assim criar, em meio a tanto trabalho e dedicação, a Unsatisfashion número 2.Inteiramente dedicada à questão da originalidade e suas temáti-cas correlatas, como tradição, patrimônio, autenticidade, autoria e identidade, esta edição resulta de conversas únicas com pessoas de diferentes nacionalidades que vivem na Argentina, Brasil, Canadá, Estados Unidos, Espanha e Itália. Já era hora de falar desse assunto de forma mais profunda para que possamos nos despir de velhos preconceitos e desmontar estereótipos. Esperamos que esta edição proporcione essa experiência a cada um de vocês.Abordando a questão da tradição, Magê Santos, da Milão nas Mãos, presenteia nossos leitores com histórias incríveis de luga-res emblemáticos desta fashion capital. Um verdadeiro passeio, do ponto de vista de uma insider, pelos pontos da cidade que qualquer amante da vida cultural urbana precisa realizar. A seguir, apresen-tamos a argentina Maydi, que produz roupas e acessórios com téc-nicas tradicionais e traz uma visão única de luxo contemporâneo. Continuando no tema, exploramos o artesanato brasileiro de norte a sul do país: uma imersão total no projeto da Artesol e uma en-trevista exclusiva com a jornalista e curadora Adélia Borges. Além disso, publicamos um mapa de localização de técnicas têxteis brasi-leiras selecionadas por Luma Guarconi. Ela colaborou nesta edição de forma excepcional e se prepara para novos projetos com a gente! Ainda falando sobre o Brasil, um dos momentos mais empolgantes desta edição, foi a conversa com Magda Cotrofe para falar do biquí-ni brasileiro como ícone de brasilidade. Precursora do o dental na década de 1980, ela nos deu razões de sobra para ter orgulho de uma das marcas que o Brasil deixa na cultura de moda ocidental.Finalmente, a matéria central desta edição se dedicou a explorar a originalidade a partir da propriedade e do patrimônio. Muitas en-trevistas internacionais deram subsídio a esse texto e, a partir dele, discussões emergentes sobre cópia, plágio e apropriação, nos aju-darão a construir um debate necessário para o futuro de uma moda não centralizada, mas global.Boa leitura, nos vemos em dezembro!Luz Neira García

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4versão 1 de 07/09/20205 hoje_moda ORIGINALIDADE6 cultura_de_moda INOVAÇÃO E TRADIÇÃO8 fashion_capital LOCAIS TRADICIONALMENTEMILANESES10 inspiracão MAYDI12 artesolARTESANATOBRASILEIRO21 perlADÉLIA BORGES24 produto BRAZILIAN BIKINI27 futuro_modaORIGINALIDADEEDIÇÃO N.2 - MAI/AGO 2020Capa: Street Style durante o Paris Fashion Week.Bolsa Gucci em parceria com GucciGhost, setembro 2017.créditos: DKSStyle (Shutterstock). Galleria Vittorio Emanuele IISímbolo da vocação artística e cultural da cidade. créditos: Michele Bitetto (Unsplash).sumáriocréditosSapato Stiletto Roger VivierUma antiga collab: criado na França, produzido na Itália.créditos: TY Lim (Shutterstock) Vista Duomo de Milão, a Torre Velasca.Onde passado e futuro se misturam.créditos: Wilhelm Gunkel (Unsplash) Campari Soda DeperoGarrafa icônica, criada pelo artista futurista Fortunato Depero.créditos: Davide Campari S.p.A Cartaz Bitter Campari, 1901Prazer à italiana. créditos: Marcello Dudovich Triennale di MilanoO concreto e o jardim da cidade. créditos: Magê Santos Maria Abdala-Zolezzi, criadora da Maydi e foto de seu editorial.A beleza como vocação. créditos: Cortesia da Marca Maydi Joseane MassonA energia vital da Artesol. créditos: Cortesia da Artesol Artesanatos têxteis brasileirosO que mais é necessário para provar nossa riqueza?(Tecelagem Ladrilha, Vestido da Associacão Renasci, Artesãs da Art Ilha na Ilha no Ferro, Espedito Seleiro, Rendeiras Bilro de Ouro, Bolsa da Cooperas, Objetos do grupo Pampa Caverá.) créditos: Cortesia da ArtesolExposição EntreMeadas, Sesc Vila Mariana.A gente só vê o que conhece. créditos: Mariana Chama - Cortesia Adélia Borges Adélia Borges.Uma conversa que poderia não terminar mais. créditos: Mariana Chama - Cortesia Adélia Borges Magda Cotrofe para Bumbum Ipanema e nos anos 1980Garota nacional créditos: Cortesia Magda Cotrofe Conjunto John Galliano para Dior de 1997, Coleção Francisco Capelo no MUDE em Lisboa.créditos: Pedro Ferreira, MUDE.Mercadorias falsicadas.Moda como status social.créditos: Shutterstock Publicidade Fashion for Futurecréditos: SmartmockupsTraduções: Vitoria Laudisio NeiraProjeto Gráco e todo o resto:Bruna + LuzAgradecimentos: Magê Santos, da Milão nas Mãos, que nos proporcionou uma imersão na cidade por meio de seu texto. Luma Guarçoni, cuja sensibilidade aora pela capacidade de ver beleza nas coisas que importam.

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O Stiletto de Roger Vivier, o modelo mais reproduzido no mundo.5Mas, mesmo sendo parte da cultura de moda, acópia vem sendo cada vez mais questionada juridi-camente e também por uma moralidade emergen-te nas redes sociais: basta lembrar o mais temidoperl do Instagram, o @diet_prada, que se popu-larizou denunciando cópias, apropriações, inspira-ções discutíveis, coleções “requentadas” e ans.Ainda que questionável, a cópia, como modo dedesenvolver  técnicas,  sempre  foi  uma  prática  daaprendizagem  artística.  Isso  contribuiu  para  quese consolidasse o pensamento de que o original re-presenta o  melhor e  é um modelo  a ser  seguido.Somente na década de 1960 Elaine Sturtevant deuà cópia nova conotação, inaugurando a apropria-ção na arte, ajudando-nos a reetir sobre a questãoda autenticidade.Se o mundo industrial substituiu o original pelamatriz  e  o mundo  digital eliminou  ambos, o  queparece mais pertinente, então? Provavelmente, re-conhecer  a  origem  das  ideias  e  a  contribuição  deterceiros na sua criação, tal qual anteviu Sturtevant.Marcas  globais  que  olham  para  o futuro  cada  vezmais se deixam inuenciar por artistas, se renovame nos ajudam a reetir sobre a originalidade comoindicativo de procedência. É o caso de Guccighost,por exemplo, que obsessivamente começou a apro-Uma das qualidades dos grandes criadores de moda e somente ela é capazde perpetuar um nome, tornando-o sobrevivente à efemeridade. Chanel, Ba-lenciaga ou Armani, mais do que roupas, criaram conceitos que continuam aser reproduzidos pela indústria da moda global na forma de estilos associa-dos às suas imagens.hoje_modaORIGINALIDADEpriar-se do logo da Gucci usando a estética da street art até que, nalmente, acabou sendo convidado por Alessandro Michelle para colaborar com a marca.Os mesmos processos seriam benvindos quandose trata não de artistas midiáticos, mas de comuni-dades tradicionais.  Como salienta  Brigitte Vézina,advogada internacional e Open Policy Member daCreative Commons, desde  que estilizados, os pro-dutos com “uma pegada folclórica” atraem os con-sumidores.  Por  isso, marcas  de  luxo  e  popularesse apropriam de outras culturas em suas coleções,como o zeram Carolina Herrera, Urban Outtterse Zara. Essas empresas foram acusadas de utilizar – sem qualquer contrapartida - elementos oriun-dos de diferentes comunidades originárias do Mé-xico em acessórios e em recursos ornamentais.Assim, o debate sobre a originalidade na modase  inltra num  universo de  difícil mensuração,onde o reconhecimento da originalidade se pau-ta na geração das ideias. Enquanto a propriedadeindustrial e intelectual protegem, respectivamen-te, a marca como e entidade e a autoria como cria-dor, o patrimônio protege o legado. A originalida-de pode estar no encontro de muitas visões ou dopassado com o futuro.CONTINUA NA PÁGINA  27
@diet_pradaGuccighost

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TRADIÇÃO E INOVAÇÃO#MILANO #FASHIONCAPITALPor: Magê Santos6cultura_de_modaDiferente de outras cidades italianas, que vivemdas glórias e belezas de seus passados, Milão sem-pre foi uma cidade com um olhar no futuro, prontaa responder às exigências do tempo.Foi berço durante os últimos séculos, de movi-mentos de vanguarda artísticos, literários, arquite-tônicos, se reinventando de tempos em tempos, massempre tentando se manter el às suas tradições, auma certa “milanesidade”.A tradição como continuidade de memória histó-rica, de identidade, de costumes, não é um conceitofácil de se transmitir em uma cidade como Milão. Ametrópole italiana é a  mais internacional do país,com cerca de 20% da população estrangeira, alémdos migrantes italianos: os milaneses de origem sãosempre mais raros por aqui e tem quem acuse Milãode ser uma cidade sem lembranças, sem tradição.Não acredito que seja verdade.Com uma grande vocação comercial, a memóriada cidade sempre passou não só por seus monu-mentos e suas glórias e derrotas, mas também peloseu comércio, seus estabelecimentos históricos  einstituições culturais, que ainda hoje são um valio-so exemplo de sua tradição, garantindo que rituaisconsolidados continuem a fazer parte da vida de mi-laneses e de quem se tornou milanês por escolha.Lugares  como  os  bares  Camparino  e  Jamaica,foram palcos de discussões artísticas e políticas. Oprimeiro,  localizado  na burguesa  Galeria VittorioEmanuele, com  sua decoração  elegante, foi  pon-to de encontro de artistas do movimento futuristacomo Umberto Boccioni e seus contemporâneos.

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A famosa marca de licores, já consolidada no início do século 20, iniciou a sua célebre parceria com artistas renomados como Marcello Dudovich, Fortunato Depero e Bruno Munari, que tornaram a comunicação e o design da marca, uma das mais inovadoras por décadas. Difícil não lembrar do car-taz em tons de vermelho de Dudovich, que mostra um casal se beijando em um canto de uma sala em penumbra, em pleno 1913, ou a icônica garranha de contorno triangular do Campari Soda, ainda em comércio, que foi idealizada pelo futurista Depero em 1932. Já o bar Jamaica, local espartano, era a referên-cia no bairro boêmio de Brera, em parte devastado pelas bombas da segunda Guerra Mundial e fre-quentado por clientes como os artistas Piero Man-zoni, Lucio Fontana, os fotógrafos Ugo Mulas e Alfa Castaldi e nos anos de 1920 até por Mussolini. Era a história da cidade que corria pelas mesas entre um drink, uma taça de vinho e um prato de minestra. Enquanto isso, a arquitetura e o design indus-trial, disciplinas onde Milão sempre se destacou, eram promovidos na Triennale, fundada em 1923 para dar visibilidade aos projetos de arquitetos, de-signers italianos e internacionais e fomentar o de-bate entre as linguagens estéticas, colocando as ba-ses do que será no futuro o chamado Made in Italy.A Triennale se transferiu, a partir de 1933, em pleno regime fascista, no Palácio das Artes, imponente cons-trução em estilo racionalista, em um momento que o regime escolhe a arquitetura como forma de se repre-sentar. Milão estava pronta a colocar o pé no futuro.A importante instituição, atravessou os anos difíceis do imediato pós-guerra cumprindo com coerência seu papel. Nos fabulosos anos de 1950, a Triennale abriu as portas ao milagre econômico, onde o sistema produtivo artesanal deu espaço ao desenvolvimento industrial. Nascia o industrial de-sign e mais uma vez em Milão, a tradição se trans-formava em inovação. É sempre a cidade, no pós-guerra, a guiar os comportamentos de consumo do país. Grande pro-tagonista nesse cenário de mudanças é a loja de de-partamentos La Rinascente, fundada em 1889 em Milão, mas com liais nas mais importantes cidades italianas. Capaz de antecipar as tendências de pro-dução e de consumo, sempre mais americanizadas, ajudou a impor o conceito da roupa pronta para o uso, confeccionada industrialmente, preparando parte do importante espaço que a moda ocupará em Milão a partir da década de 1970. Nessa mesma década, a jovem Miuccia Prada en-trou na empresa fundada pelo avô em 1913 e partin-do de uma tradição já consolidada, a da produção de bolsas e malas de luxo, conduziu a grife no gran-dioso percurso da moda italiana, tornando a Prada uma das marcas mais criativas dos dias de hoje. E é sempre mantendo um pé no passado e no futuro, que nos últimos 40 anos Milão se conso-lidou como cidade de referência na moda prêt-à--porter e no design industrial, cultivando a sua longa relação entre cultura técnica e cultura esté-tica, entre tradição e inovação. Campari soda Depero, embalagem emblemática do futurismo. Cartaz Campari, 1901.7

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8fashion_capitalLOCAIS TRADICIONALMENTEMILANESES

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1.LA RINASCENTEPiazza del Duomo, 3Turistas e milanesesentram e saem apressadosda  loja  de  departamentossem  conhecer  a  históriasecular  do  estabelecimento.Inaugurada  em  1889  pordois irmãos com o nomede  Magazine  Bocconi,  aentão futura La Rinascentemudou o modo de consumirdo  italiano  médio  comsuas  prateleiras  acessíveise vitrines inovadoras nasfiliais  espalhadas  pelasprincipais cidades da Itália.4.HOEPLIVia Ulrico Hoepli, 5A livraria das livrariasem  Milão,  foi  fundada por um  suíço  em  1870.  Poucosanos  depois,  Ulrico  Hoeplicomeçou  também  a  editarlivros.Depois  das  destruições  dasegunda  Guerra  Mundial,  alivraria se mudou para o en-dereço atual e se instalou emum  prédio  de  seis  andares,ocupados por cerca de 175 miltítulos.Gerações de crianças  mila-nesas foram levadas por paise avós para comprar livros naHoepli. A livraria, ainda hoje,é administrada pela família.5.TRIENNALEViale Emilio Alemagna, 6A instituição cultural, pro-move  desde  1923,  mos-tras  de  design,  arquitetura,moda e cinema, dando gran-de  visibilidade  à  arte  con-temporânea.    Desde  1933ocupa  o  Palazzo  dell’Arte,construção de arquiteturaracionalista,  projetado  porGiovanni Muzio.Local de referência para odesenho  industrial,  desde2007  hospeda  o  TriennaleDesign Museum, o primeiromuseu de design italiano.6.JAMAICAVia Brera, 32Inaugurado  em  1911,  obar milanês, em português,poderia  ser  denido  comoum boteco. Falar da históriado Jamaica é falar da históriade Brera, o bairro mais boê-mio de Milão por anos.Reduto de artistas, fotógra-fos,  intelectuais,  jornalistase políticos, pelas suas mesasescorreram  os  vícios  e  vir-tudes da sociedade milanesa.Famoso  também  pelasmostras  de  arte  e  fotograaque  realizava,  ainda  hoje  éadministrado por uma dasnetas da fundadora e fre-quentado  por  jornalistas  demoda,  estudantes  da  Aca-demia de Belas Artes de Bre-ra, milaneses e turistas.2.CAMPARINOPiazza del Duomo, 21O  único  bar  no  mundoda  famosa  marca  é  100%milanês.  Aberto  na  GalleriaVittorio  Emanuele  em  1867por  Gaspare  Campari,  em1915  se  renovou  com  umadecoração em estilo Liberty,que  podemos  admirar  atéhoje  e  ensinou  geraçõese  gerações  de  milanesesa  apreciar  o  aperitivo,inventando o Campari Soda.Frequentado duranteanos  por  políticos,  artistas,intelectuais e milanesescomuns,  ainda  hoje  é  umponto de referência na cidade.3.FRATELLI PRADAGalleria Vittorio Emanuele IIA primeira  loja  da  marca,foi  aberta  em  1913  naGalleria Vittorio Emanuelepelos irmãos Mario eMartino  Prada  e  vendiabolsas  e  malas  de  luxo.Em  1919  Prada  se  torna  ofornecedor oficial da famíliareal italiana.A marca caiu no esque-cimento  no  pós-guerra  evoltou ao hall das  grandes grifes italianas nos anos 90com Miuccia Prada, neta deMario.Na página ao lado, a entrada da Triennale.9



















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inspiraçãoMAYDICom foco no mercado de luxointernacional, Maria Abdala-Zolezzicriou em Buenos Aires a Maydi,marca de acessórios e roupas que sebaseia no tricô artesanal e no uso delãs de camelídeos (lhama, vicunha eguanaco). Tal sosticação resulta de umperl  criativo  cultivado  em  solo  fértil:Londres, Milão e, principalmente, Paris,onde aprendeu a lançar, a posicionar ea desenvolver marcas de luxo.

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11Publicitária,  Maria  foi  para  Londres  em  1999para estudar moda. De lá para Paris,  onde cons-truiu sua carreira: trabalhou em empresas de co-municação de moda de luxo, como a Totem Press(que lançou Raf Simons e Jeremy Scott e os belgasWalter  Van  Beirendonck  e  Veronique  Branqui-nho); no showroom de Robert Dodd (que poten-cializou  nomes  como  Jill Sander  e Kenzo  Taka-da); com Isabel Marrant e no programa DesignersApartment  (Federação  Francesa  da  Moda)  quepromovia o Made in France.Retornou à Argentina em 2013 para lançar umamarca “enraizada”  que  expressasse  sua  identida-de, mas dedicada ao mercado de luxo internacio-nal. Em busca de originalidade, os materiais natu-rais que simbolizam a tradição têxtil Argentina alevou às lãs, aos raros tingimentos naturais e aosartesãos, cujas mãos transformam suas ideias numproduto único - autóctone, mas misturado com aexperiência europeia -, que é o que denominamoscontemporary design: estética urbana, uma nova visão sobre o gênero, forte preocupação com a sus-tentabilidade e com a elevação da cultura de moda.Tudo começou com acessórios – golas avulsas,echarpes volumosas e luvas –, que foram apresen-tadas na Fashion Factory e acabaram nas vitrinesda Bi de  Milão, combinadas com suéteres  deStella McCartney. A revista inglesa Wallpaper sol-tou uma nota de grande repercussão e ela começoua circular na Europa nos lugares mais propícios aolançamento de designers emergentes. Os japone-ses, sempre  em  busca de  talentos  se  encantarame hoje Maydi está presente em diferentes lojas deluxo no Japão, inclusive na Biotop.Amantes dos têxteis, do artesanato de alta qua-lidade e da estética minimalista, os japoneses são70% de seu mercado. Alcançar esse público, resul-ta do desenvolvimento de produtos de qualidade eoriginalidade indiscutíveis: “os japoneses olham aspeças com lupa”, arma Maria.De aparência simples e fácil, o que está por trásda Maydi  mostra  a  pesquisa, a técnica  e  a  estra-tégia correta  para  a  distribuição  mundial  do  quea Argentina tem de melhor. Tudo começa pela se-leção de  matérias-primas certicadas,  passa pelorelacionamento equitativo com os artesãos e alcan-ça o desenvolvimento de produtos. Maria começapelas pesquisas estéticas com múltiplas referências,desenvolve os materiais e as tramas, cria a modela-gem das peças de acordo com o que cada materiallhe oferece. As imagens de divulgação são primoro-sas e deixam claro que se trata de um artesanato dequalidade.E,  assim,  a  pergunta  a  Maria  é  como  mostraro  valor  desse  trabalho?  Exige  muita  energia,  poismuitos clientes pensam que essas peças devem serbaratas,  mas sua  percepção  é  totalmente oposta:“Eu trabalhei na Hermès onde as peças são todasartesanais. Lá, o artesão é visto como um artista. Lá,o artesão é um deus.”Maria Abdala-Zolezzi, criadora da Maydi.

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artesolCriada há 22 anos pela antropólogaDra.  Ruth  Cardoso,  a  Artesol  é  umaassociação  que  reúne  e  representa  aforça da produção artesanal brasilei-ra. O projeto, que inicialmente teve ameta de contribuir para a superaçãoda vulnerabilidade social de artesãosespalhados pelo território nacional,hoje  levanta  também  a  bandeira  do“reconhecimento que esse artesanatomerece”, como descreve Josiane Mas-son. A Artesol está presente em 25 es-tados brasileiros e “coloca em rede”aproximadamente 250 membros en-tre mestres e artesãos, atuando emquatro frentes: desenvolvimento eco-nômico, fomento cultural, capacita-ção e comunicação.A Artesol é uma organização sem ns lucrativoscriada em 1998 pela antropóloga Dra. Ruth Cardo-so, então primeira-dama do país. Naquele momen-to o artesanato tradicional brasileiro era totalmentedesconhecido  e  desvalorizado,  e  técnicas  tradicio-nais importantes herdadas dos nativos, dos povosafricanos e dos europeus estavam se perdendo. Es-sas técnicas  já estavam presentes  em todo  o  país,mas não havia nenhum olhar de valorização que asreconhecessem  como  “bacana,  primoroso,  impor-tante e incrível”, explica a diretora Josiane Masson.A associação surgiu para retirar esses grupos deartesãos da vulnerabilidade social por meio da gera-ção de renda. Além disso, a Dra. Ruth queria mos-trar que esse artesanato não era simplesmente fazercoisas, mas sim uma expressão cultural, que falariasobre quem somos e quem é o Brasil. Nasceu assima Artesol, acreditando que o artesanato e a tradiçãotêm imenso potencial para gerar renda para essascomunidades,  muitas  vezes  afastadas  das  oportu-nidades de trabalho. Quem são elas? Comunidadesribeirinhas,  caiçaras,  quilombolas  e  sertanejas  es-palhadas pelo Brasil inteiro.Segundo Josiane, a inclusão produtiva baseia-sena salvaguarda desse “tesouro”, garantindo que ossaberes  tradicionais sejam  repassados  e  evitandoseu desaparecimento. Para isso é necessário organi-zar uma estrutura que possibilite que essas técnicassejam materializadas em objetos com potencial co-mercialização pois, na prática, esse artesanato devegerar renda: essa é a única forma de fazer com que oartesão se sinta motivado e valorizado e, em decor-rência, esses saberes não se percam.A associação cria condições de valorização desseartesanato, pois “temos que ampliar o número depessoas que fale e que entenda o processo, pois omercado precisa crescer e as pessoas precisam pa-gar o preço justo”, salienta Josiane. Com esse foco,a Artesol possui um programa que organiza exposi-ções, seminários, ocinas e festivais para levar atéas pessoas a importância desses saberes e fazeres.Uma extensa produção de conteúdos também criaconexões do  artesanato  com  outras  dimensões  dasociedade inserindo-o em temas atuais. Essas açõesse pautam na certeza de que “não valorizamos aqui-lo que não conhecemos” e que assim, “quanto maisdebatido, mais se reconhecerá a relevância e a im-portância desse artesanato para nossa cultura.”Joseane Masson12ARTESANATOBRASILEIRO

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A Artesol quer fazer com que o brasileiro olhe para sua produção artesanal e diga: “Que orgulho! Como ele é diverso, interessante, bonito, criativo, único como ele diz do conjunto de representações identitárias que nosso país tem.”- Joseane Masson

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Tecelagem Ladrilha, no Rio Grande do Sul.Capacitar os artesãos no dia-a-dia signica “aju-dar a construir um caminho”, tornando esses gru-pos autônomos, protagonistas e independentes para que conquistem renda a partir de seu trabalho. Por meio de uma tecnologia social, “fazemos com que eles tenham consciência da importância cultural de seu trabalho e ajudamos a criar um sentido de as-sociativismo e trabalho coletivo”, explica Josiane. A capacitação inclui toda a parte administrativa, pas-sa pela comercialização e comunicação e, também, interfere na lógica do produto, criando nos grupos de artesãos a percepção da necessidade de inovação e de desenvolvimento para atender às demandas atuais do mercado.Essa visão sistêmica é uma contribuição da qual Josiane se orgulha por ter ajudado a cons-truir desde que assumiu o legado da Dra. Ruth Cardoso. Formada em Terapia Ocupacional e com 28 anos de experiência e formação na área do ter-ceiro setor, gestão e organização de processos sociais, há uma década ela identicou que o tra-balho em rede, “juntar as pessoas”, aproximar os artesãos e os diferentes atores, seria fundamental para fortalecer o artesanato. A beleza “da rede”, contudo, não o exime o traba-lho de diculdades inerentes ao encontro de indiví-duos em realidades distintas. Problemas de acesso a muitos lugares, a inexistência de infraestrutura em algumas regiões, a diferença de repertórios - que faz mais difícil a inclusão de todos os artesãos neste novo cenário -, a fragilidade das políticas pú-blicas para o fortalecimento e desenvolvimento dos artesãos, são obstáculos a superar cotidianamente. A Artesol acredita que setor precisa de uma reta-guarda, como nanciamento, benefícios e regulação (por exemplo, selos de qualidade, de origem), para que a engrenagem funcione melhor.Qualquer avanço, contudo, perderá sua força se a sociedade não mudar seu olhar sobre o artesa-nato brasileiro, muitas vezes subvalorizado, pro-vavelmente porque é muito incompreendido. Para trabalhar nessa frente, um dos principais patroci-nadores da Artesol, o Grupo Anhembi, abriu um espaço de comercialização das peças produzidas nessas comunidades no shopping Iguatemi JK. Se-gundo Josiane, a loja Artis é mais do que um es-paço de comercialização e o objetivo não é vender somente, mas mudar a cabeça das pessoas. O ar-tesanato brasileiro, colocado no mesmo corredor das grifes mais famosas do mundo nesse shopping center de luxo, dá ao artesanato “um lugar de va-lor que ele não tem.” É uma ação estratégica, de comunicação e posicionamento, que coloca o ar-tesanato “em pé de igualdade” com aquilo que já estamos acostumados a valorizar.No momento a Artesol está trabalhando para fortalecer cada vez mais as conexões. Diferentes iniciativas são lançadas para que que se trabalhe em conjunto, se estimule a colaboração mútua que fortalece não só cada um, mas todo o sistema que mantém o artesanato vivo. Para a Artesol, todos são protagonistas dessa história.14

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Vestido em renda renascença da Associação Renasci.TÉCNICAS TÊXTEISNO BRASILPor: Luma GuarconiFonte: ArteSolO artesanato brasileiro repre-senta um retrato social e cultural da sociedade brasileira em diálogo com suas mais diversas realidades. Na grande variedade de tipologias, técnicas, matérias primas e histórias de origem podemos entender que em cada saber e em cada fazer existe uma essência única, uma alma que vai além do produto, uma originali-dade que vive nas mãos e nas vidas desses artesãos. Aqui apresentamos uma seleção que almeja exemplicar a riqueza e a diversidade presente no território brasileiro de forma a convidar nossos leitores a entrare nesse mundo de possibilidades. O ARTESANATO NA MODANos últimos anos temos visto muitas técnicas saírem de lugares considerados distantes para alcançar as passarelas brasileiras e até o comér-cio internacional. Essa maior visibilidade resulta de parcerias que se estabeleceram entre marcas, designers e grupos artesãos com a retaguarda da Artesol, que atua como articuladora. Capacitando os artesãos e tornando-os cada vez mais visíveis, é natural que os designers de moda mais autorais ou mesmo as marcas consagradas, os procurem para estabelecer parcerias.A moda, segundo Josiane, demorou a se apro-ximar do artesanato, pois “antes havia certa ver-gonha e, salvo alguns poucos estilistas que apre-sentavam a brasilidade no seu trabalho, havia poucos que dialogavam com isso.” Nos últimos anos a relação com a moda está crescendo, uma vez que um maior número de consumidores e criadores percebe que “o artesanato brasileiro é uma fonte inesgotável de beleza e diversidade.” É o artesanato também, para a moda, fonte de uma originalidade que nasce da manutenção dos traços da tradição com a inovação que se requer a cada novo produto que dialoga com o tempo atu-al. Diferentemente do tempo dos produtos indus-triais, ele não pode ser “consumido vorazmente” e deve ser pago conforme seu valor. Esse é o reco-nhecimento por tudo o que ele nos traz.Pode-se dizer que a moda começou a olhar para toda a riqueza de materiais e técnicas e a perceber que elas são fonte de originalidade, um dos pilares da diferenciação e de geração de valor. O artesanato brasileiro é pleno de singularidades e nos ajuda a contar histórias únicas que são mui-to valorizadas nesse universo. Além disso, sendo a indústria da moda chamada cada vez mais à responsabilidade social e ambiental, o artesanato tradicional é um recurso ideal em sua dimensão prática, estética e simbólica. Parcerias entre marcas, designers em artesãos, podem signicar um conito estrutural, que é a coautoria. O artesão é fundamental porque ajuda a realizar as ideias que estão na cabeça do desig-ner e, assim, a “originalidade, é algo único que surge dos dois saberes”, aponta Josiane. Nada mais justo do que ambos reconheçam isso. Tra-ta-se de um compromisso prossional e ético, de respeito e comunicação da autoria do outro.

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BordadoCouroTecelagemRendaTrançadoCrochêLUMA GUARÇONIA autora deste mapa é capixaba de nascença ecidadã do mundo. É apaixonada pelo artesanatobrasileiro, pelas possibilidades criativas que elerepresenta e pela ferramenta de progresso socialque ele pode vir a ser.Apesar da  pouca  idade, tem  um  currículo eexperiência respeitáveis. Cresceu em São Pauloe viveu em Miami, onde começou a trilhar suacarreira na moda há mais de dez anos. Em 2014foi  para Londres  estudar na  prestigiosa esco-la  Central  Saint  Martins  e,  desde  então,  apro-veitou as oportunidades que a vida lhe trouxe.  Viveu entre Londres, Nova Iorque, Paris e Mi-lão,  onde  trabalhou  para  marcas  como  AcneStudio, Marni, Hood by Air, Marques Almeidaalém de um ano como modelista no GarmentDistrict de Nova Iorque para grandes empresas.Agora começa a caminhada nal para o de-senvolvimento da sua coleção de graduação nafaculdade, e  nela planeja  integrar o  projeto depesquisa  sobre  o  artesanato  de  raiz  brasilei-ro  que  vem realizando  há mais  de  dois  anos.  E, assim, Luma apresentará o artesanato comoalto luxo, inserindo-o no contexto da alta modae propondo uma cadeia produtiva responsável,sustentável e humana para a moda.

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Clarearte - MG Matizes dumont - MGArt Ilha - ALTimbauba - RNCabocla Criações - GOEspedito Seleiro – CEIrineu do Mestre – PERedeiras do extremo sul – RSCentral Veredas – MGCarqueijo – CEXique Xique – PIAUMMA – BARenda Irlandesa Asderen – SERenda renascença Renasci – PBRendeiras Bilro de Ouro - MAFile Inbordal – ALCapim Dourado Mumbuca – TOBuriti Artecoop - MA Piaçava Copartt - BA Carnaúba Ipaguaçu Mirim – CECooperas (sisal e caroá) – BAArto – CEPampa Caverá – RSAgulha Mágica- DF

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Artesãs da Art Ilha na Ilha no Ferro, AlagoasEspedito SeleiroBordado1- CLAREARTE - MGUtiliza as técnicas de bordado deagulha com  os pontos  clássicosem  fios  coloridos  e  crochêem  desenhos  realizados  pelodesigner  e  idealizador  MoisésJordano. As peças possuem altadensidade,  relevos  e  grandecomplexidade cromática.2- MATIZES DUMONT - MGCom  técnicas  de  bordado  deagulha e usando  fios coloridos,o  grupo  que  trabalha  hátrês  gerações  faz  ilustraçõesbordadas.  Os  desenhos  trazemcenas reflexivas a partir daprática  psicopedagógicadenominada Bordar o Ser.3- ART ILHA - ALGrupo  de  bordadeiras  quedesenvolveu uma técnica própriachamada  Bordado  Boa  Noite– nome inspirado em uma florlocal  -  que  descende  do  crivo,ou  seja,  retirar  fios  do tecido  erebordá-lo usando os elementosvazados.4- TIMBAUBA - RNPara atender a um pedido de umestilista, se formou um grupo demulheres  que produz  bordadosbaseados na tradição portuguesa.São os famosos richelieu, que secaracterizam  pelos  recortes  ebordados de agulha para fazer oscontornos.5- CABOCLA CRIAÇÕES - GOUma  iniciativa  pessoal  deuorigem a um projeto de remissãode pena e de desenvolvimento decidadania. Um grupo de homense  mulheres  que  bordam  comtécnicas  clássicas  de  bordadode agulha, produzindo desenhosmuito coloridos.Couro6- ESPEDITO SELEIRO – CEEspedito Seleiro, mestre da cultura, tem um conhecimento na costurae trabalho com o couro que já atravessa três gerações. Para que seuofício  não  se  perdesse  ensinou-o  aos  seus  irmãos,  filhos  e  netos  etambém fundou uma oficina escola.7- IRINEU DO MESTRE – PEA técnica utilizada é a da costura do couro e sua ornamentação, criandopeças únicas que também atravessam gerações. Sua fama é enorme e atendeu pessoas famosas, de Luiz Gonzaga ao Papa João Paulo II.
7- IRINEU DO MESTRE – PE

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RendaRendeiras Bilro de OuroTecelagem8- REDEIRAS DO EXTREMOSUL – RSCom pouco mais de dez anos deexistência,  este  grupo reutilizaredes de pesca de camarãodescartadas  após  longo  uso  eescamas de peixe para criaracessórios únicos de moda.
9- CENTRAL VEREDAS – MGAs  artesãs,  reunidas  há  quaseduas  décadas,  fiam  o  algodão,o tecem e acabam peças  comoxales  e  mantas  únicas,  tingidaspor cascas e plantas naturais.Todo  esse  conhecimento  éherdado  dos  ancestrais  ereproduzido nas novas criações.10 - CARQUEIJO – CEUsando  técnicas  de  origemafricana,  este  grupo  trabalhacom  fibras  bem  diferenciadas,como  palha  de  bananeira,  talode  coqueiro  e  fibra  de  taboana trama para criar artefatosdomésticos e decorativos.
11- XIQUE XIQUE – PIA tecelagem de redes de algodãoé  realizada  pelos  grupos  deartesãos  que  se  juntaram  parareunir forças. Operando o tearde  macaco  e  trabalhando  oalgodão  tingido  e  outras fibras,os artesãos realizam  texturas ecoloridos diferenciados.
12- AUMMA – BAHá quase duas décadas esse grupode artesãs se dedica a tecer redee a fazer acabamentos exclusivosde  crochê,  formando  franjasimensas e delicadas. A união dasmulheres  vem  cumprindo  suameta de transformar a realidadepor  meio  do  trabalho,  gerandoautonomia e apresentando novaspossibilidades de vida.13- RENDA IRLANDESA ASDEREN – SEO grupo de rendeiras da Divina Pastora foi incluído em 2009 na listado Patrimonio Cultural do Brasil. De origem europeia, essa renda dáorigem a peças exclusivas, com alto grau de detalhamento e relevosmarcantes usados na decoração e no vestuário.
14- RENDA RENASCENÇA RENASCI – PBA  renda  renascença  tem  sua  origem  na  Europa  e  faz  parte  dacategoria de rendas de fitas. Esse forte grupo de artesãs que trabalhaem conjunto há 20 anos, produz peças de roupa e artefatos para acasa com grande destreza e delicadeza.15- RENDEIRAS BILRO DE OURO - MAA técnica de bilro, que é da produção de rendas como entrelaçamentodos fios, é de origem europeia. Há pouco mais de 30 anos, esse grupose instalou e organizou as mulheres rendeiras da cidade, que produzrendas para muitas aplicações.16- FILE INBORDAL – ALUm grupo inteiramente dedicado à técnica do filé – que é baseada no bordado sobre um tecido com estrutura de rede -, tem uma grandeprodução de acessórios e itens para casa muito coloridos e alegres.

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Trançado17- CAPIM DOURADOMUMBUCA – TOO  artesanato  com  o  “ouro  docerrado”  tem  sua  origem  nosíndios  da  etnia  Xerente:  peçasdelicadas  são  construídaspelo  trançado  e  a  linha  deburiti. Há 20 anos, o grupo seformou  e  conquistou  grandereconhecimento  e  algumaproteção ambiental e social.
18- BURITI ARTECOOP - MAO  trançado  da  fibra  de  buritidá  origem  a  acessórios  eartefatos domésticos  de grandeversatilidade.  O  domínio  datécnica  é  uma  herança  indígenae vem sendo transmitida noMaranhão há muitas gerações. 
19- PIAÇAVA COPARTT - BAUtilizando  a  palha  de  piaçava,este  grupo  recorre  a  técnicasdo  trançado  e  ao  tingimentonatural para criar acessórios demoda contemporâneos com fortereferência  à  herança  deixadapelos  índios  tupinambás  quehabitavam a região.20- CARNAÚBA IPAGUAÇUMIRIM – CEEste  forte  grupo  de  artesãstrabalha  com  o  trançado  napalha  de  carnaúba,  que  é  amais  abundante  no  Ceará.Bolsas  e  artefatos  domésticoscom  padrões  exclusivosherdados  da  presença  indígenana  comunidade,  conferemsingularidade às peças.
21- COOPERAFIS  (SISAL  ECAROÁ) – BAUm  grande  e  consolidado  grupode  artesãs,  utiliza  a  técnica  dotrançado  em  matérias-primaslocais  –  caroá  e  sisal  -,  para  darorigem a uma série de acessórios eartefatos domésticos que tambémsão tingidos de forma natural.Crochê23- ARTFIO – CEGrupo que vem se consolidando há cerca de 20 anos, tem o crochêcomo  técnica  e  os  barbantes  como  matéria-prima.  Produzemdiversos elementos de decoração com uma linguagem estética única einconfundível, sendo lembradas pela decoração de árvores.
22- PAMPA CAVERÁ – RSUm  grupo  de  artesãs  que  trabalha  técnicas  muito  diversificadas  –tecelagem,  crochê,  tricô,  modelagem  em  biscuit,  trama  em  couro,marcenaria  e  joalheria  -,  dando  origem  a  peças  inspiradas  napaisagem gaúcha.
24- AGULHA MÁGICA- DFMaria Ana borda  desde criança  e em  1997 fez  um curso de Designpelo Sebrae,  a partir  do  qual foi  convidada a  montar  um grupo  deartesãs. O grupo se expandiu muito rapidamente, chegando a contarcom quatro núcleos de produção que ficam em outras localidades deBrasília, reunindo mais de 450 artesãs.Bolsa da CooperafisObjetos do grupo Pampa Caverá.
17- CAPIM DOURADOMUMBUCA – TO18- BURITI ARTECOOP - MA

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ADÉLIA BORGESMas o Brasil não tem design!Essa frase, dita em tom dequestionamento e pesar, foi ouvidainúmeras  vezes  pela  jornalista  ecuradora  brasileira  Adélia  Borgesdurante  a  década  de  1980  quandoassumiu o cargo de editora da revistaDesign e Interiores. Em seus primeirospassos nesse campo – antes haviatrabalhado em diferentes veículos decomunicação  e  se  dedicado  a  outrastemáticas  –,  Adélia  foi  deixando-seseduzir pelo universo do design. Paraela, além de estar presente em todos oslugares e objetos, o design apresentasoluções  e  traz  melhoria  e  qualidadede vida para a sociedade: “foi aí que odesign me pegou”.perl

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n mero dois ORIGINALIDADE tradi o_inova o c pia_originalidade artesanato_solid rio brazilian_bikini N 2 MAI AGO 2020

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produto

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BRAZILIAN BIKINIORIGINALIDADE DO BIQUÍNI  BRASILEIRO25Foi  nos  anos  1980  que  MagdaCotrofe  deslou,  com  seu  corpo  ebeleza  únicos,  o  biquíni  o  dentalpelas areias da Cidade Maravilhosa.  O que ela não imaginava é que suaousadia marcaria a história damoda brasileira e da liberdade docorpo feminino para sempre.Tanto no verão no  hemisfério sul quanto donorte, o biquíni  brasileiro é  onipresente: a  modapraia brasileira é amada internacionalmente. Umexemplo de sua popularidade foi sua presença em2019  na  famosa  Galeries  Lafayette  em  Paris,  naloja  temporária  da  multimarcas  Brazilian Bikini Shop. O marketplace  das  principais  marcas  bra-sileiras  de biquíni,  expôs  na capital  mundial  damoda nomes como Adriana Degreas, Blueman, Sa-linas e Triya, entre outras.O Brazilian Bikini é tão desejado que o nome se tornou uma estratégia de marketing para empre-sas de moda praia e lingerie internacionais. Apesarde não serem autenticamente Made in Brazil, elas se apropriam desse nome para identicar um mo-delo especíco de calcinhas que reproduz a mode-lagem do mais tradicional biquíni brasileiro, muitofamoso por valorizar o bumbum das mulheres.É  Rosane  Feijão,  autora  do  livro  Moda e Modernidade na Belle Époque Carioca e Doutora em Comunicação pela UERJ, quem confirma quea  moda  praia  brasileira  conquistou  mercadosinternacionais.  Segundo  a  pesquisadora,  issonão  aconteceu  de  maneira  aleatória,  mas  é  oresultado  de  um  imaginário  construído.  Elaconta que além da atmosfera tropical do Brasil,a consagração do biquíni brasileiro foi tambémo resultado do investimento  de empresários edesigners nas  décadas de 1980 e  1990 que sesobrepôs à anterior invenção francesa.Mas nem só de um biquíni se faz um bumbum.É aí que entra uma das principais responsáveispara a consolidação mundial do biquíni brasilei-ro: Magda Cotrofe, sex symbol responsável porprojetar o biquíni brasileiro no mundo. Sua re-levância é tanta que hoje ela é uma das consul-toras do Museu do Biquini na Alemanha, que lherende  homenagem  por  sua  contribuição  para  amoda-praia internacional.A história de Magda com o o dental começouem 1985. Ela contou que o o dental já existia, masnão deixava o corpo bonito, pois não tinha a curvaque o caracteriza. O modelo brasileiro, que ela seorgulha  de  inaugurar,  foi  criado  por  Alcindo  Pe-reira, mais conhecido como Cidinho da Bumbum,então proprietário da carioca Bumbum Ipanema.Os holofotes mundiais se voltaram para essa peçatão pequena, quando Magda vestiu o o dental noverão  em  Ibiza,  deslando  com  muito  charme  acriação de Cidinho.

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“Não bastava ter bunda para usar o o dental, mas também tinha que ter muito peito.” - Magda Cotrofe26Apesar do evento que marcou o biquíni brasileiro ter sido em terras estrangeiras, foi no Rio de Janeiro que ele se consolidou. A combinação de uma ex-ca-pital do Império com a geograa praiana da cidade, para Rosane Feijão, criou o cenário perfeito: “uma capital à beira-mar”. A atmosfera paradisíaca repre-sentada pelo Rio de Janeiro se estabeleceu nos anos 1950 com a Bossa Nova e o estilo de vida boêmio e praiano dos jovens, que tinham e ainda têm como ponto de encontro as praias da zona sul. Se durante os anos de censura os cariocas se “comportaram”, com o m da ditadura militar se instalou um cená-rio de grande liberdade que, segundo Magda, chega a ser bem mais ousado que hoje.É essa aura que se transfere quando uma es-trangeira compra um biquíni brasileiro, acreditan-do ter, nem que seja um pouco, do bumbum Mag-da Cotrofe. Aliás, segundo contou, quando chegou ao Rio de Janeiro e começou a se preparar para ser modelo, logo de cara já disseram que seu corpo, pleno de sensualidade, era destinado à fotograa de biquíni e não às passarelas.Garota de praia e muito bronzeada, Magda en-carnava o biquíni o dental e asa delta no nal dos anos 1980, criando uma relação única entre corpo, moda e mulher. Podemos inclusive, estabelecer uma relação com Twiggy, cujo corpo se alinhava perfeitamente com a minissaia deslada em Lon-dres nos anos 1960, causando também furor e imortalizando não só a peça, mas a imagem. Cada uma a seu modo, ambas as modelos marcam a his-tória da libertação do corpo feminino. É claro que o fato de Magda ter um corpo per-feito e cheio de curvas conta a seu favor, mas “não bastava ter bunda para usar o o dental, também tinha que ter muito peito”, conta Magda, referin-do-se à coragem de se apresentar de o dental sem se importar com o julgamento alheio. Por deixar boa parte da pele à mostra, o biquí-ni foi sempre um símbolo de expressão do corpo da mulher. Rosane vê essa peça de vestuário “ca-minhando de mãos dadas com a história das con-quistas das mulheres sobre seus próprios corpos”. A especialista arma que no século 20 houve “uma batalha pelo recuo do pudor e, a cada verão, meno-res se tornavam os biquínis, desnudando áreas até então sempre cobertas em público”. Mas que, após os anos 2000, a batalha parece ter mudado, agora é sobre a diversidade dos corpos, uma luta contra os padrões de beleza impostos pela mídia.Um grande inuenciador deste novo pensamen-to, é o movimento Body Positive - do inglês, corpo positivo -, criado nos Estados Unidos no nal da década de 1990 por Connie Sobczak e Elizabeth Scot. O movimento tem como objetivo celebrar e valorizar os diversos corpos femininos fugindo dos padrões impostos. E, é claro, que esse novo pen-samento inuencia diretamente a moda praia, que além de se fazer presente nas marcas consagradas que agora oferecem maior diversidade de mode-los de bíquinis, temos também novas marcas com a missão Body Positive, como a queridinha das fashionistas, Cosmo Swin. Além de ser um recurso de libertação feminina, o biquíni pode ser usado como uma ferramenta para imprimir mudanças no corpo da mulher. O maior exemplo são as marquinhas causadas pelo bronzeamento da pele exposta ao sol que, segundo Rosane, começam a ser bem aceitas a partir dos anos 1920 com a popularização e permissão dos esportes ao ar livre para as mulheres. Nas déca-das de 1980 e 1990 Magda Cotrofe passou diver-sos cremes e criava misturas caseiras para chegar à cor perfeita - que à ocasião era o mais bronzeada possível - mas nunca gostou de ter a marquinha à mostra, pois não a considerava elegante. Mas não há dúvidas de que essas marquinhas podem ser muito desejadas, como vimos com o êxito do clipe Vai Malandra com Anitta. A cantora popularizou a carioca Erika Bronze, criadora do biquíni de ta isolante, usado para tomar sol na laje e car com a marca de sol “perfeita”.Com essa recente febre dos biquínis nada con-vencionais, é possível observar que o cenário da moda praia carioca continua se reinventando e in-uenciando a moda. O que faz o biquíni brasileiro ser original, além de tudo o que já foi falado, é a ou-sadia e ao mesmo tempo a simplicidade das peças. Um exemplo singular, são os biquínis preferidos de Magda Cotrofe: apesar de nossa musa adorar marcas como Vix, Salinas e Lenny, são os biquínis comprados nas barraquinhas da praia que ela mais ama. Magda acredita que a originalidade brasileira está na alegria, positividade e espontaneidade que expressamos e que se reete na nossa moda. A originalidade do Brazilian Bikini resulta da combinação de fatores únicos e bem brasileiros: o lugar paradisíaco, a cultura social ligada à praia, o alto investimento em tecnologia de produto, a necessidade de libertação do corpo feminino e um símbolo, como Magda, à altura: linda, carismática e com muita coragem!

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futuro_modaFASHION HERITAGEComeça a fortalecer-se na Europa odiscurso acerca do fashion capital, que se preocupa em conectar o patrimôniocultural da moda europeu com o futu-ro das marcas e da moda. É uma ideiainteressante,  que  transcende  conceitosamalgamados, como  aquele  de  que  oque zemos e usamos ontem é algo ve-lho, ultrapassado e deve ser descartado.Desde  2014,  uma  associação  reúnemais  de  40  instituições  europeias  pú-blicas  e  privadas,  tem  a  nalidade  depotencializar  o  legado  de  moda  euro-peu. Marco Rendina, Managing Direc-tor da European Fashion Heritage Association,  conta que  o objetivo  da EFHA é  “recolher  e  colocar  em  diálo-go  instituições  culturais  da  moda,  ar-quivos e museus de marcas, pesquisa-dores,  curadores e  criativos”, com  osolhos voltados  para a  valorização dopatrimônio  cultural  digital  da  modapor meio do acesso online.O EFHA se constituiu a partir de umprojeto prévio  nanciado pela  Comu-nidade  Europeia.  Em  2012,  junto  comDieter  Suls  do  ModeMuseum  e  outros18 arquivos e museus, Marco coordena-va as atividades da Europeana Fashion,que já previa organizar e disponibilizargratuitamente o acesso online ao patri-mônio  de  moda  institucionalizado.  Aação, devido à origem de seus recursos,tem seu foco no fortalecimento da cultu-ra de moda europeia, sem deixar de re-conhecer todos os que zeram parte daconstrução dessa identidade. O próximoencontro da EFHA, inclusive, tratará daquestão da apropriação cultural tendocomo centro o tratamento e comparti-lhamento do patrimônio cultural de co-munidades tradicionais não europeiasdentro  desses  arquivos.  Segundo  Mar-co,  deseja-se  “encontrar  um  caminhopara respeitar  os interesses,  valores edireitos culturais dessas comunidades.”A disponibilização desse patrimônioa  um  público  cada  vez  mais  amplo eheterogêneo, promoverá novos usos desse conhe-cimento acumulado,  mantendo vivos  os arquivosdas instituições. Entre esses novos usos certamen-te  estão  os  prossionais  de  criação  –  rompendonovamente  nosso  senso  comum  sobre  o  que  é  aoriginalidade –, que usam os arquivos como ins-piração. Marco destaca que na visão do grupo “oarquivo representa  um modo de  salvaguardar aautenticidade da mensagem contemporânea, esta-belecendo relação com ícones do passado.”São muitas as marcas de moda que participamda EFHA e apresentam casos reais do uso de seusarquivos nos seminários do grupo. A realidade portrás das missões sociais e comerciais das empresase  instituições,  mostra  um  rico  diálogo  entre  em-presas e os meios acadêmicos para a compreensãodo heritage, que pode ser sintetizado como o patri-mônio material e imaterial que a moda representa.A  originalidade,  prossegue  Marco,  deve  ser  algocompreensível no  mundo  contemporâneo  e, por-tanto, “é algo gerado pelo encontro dos artefatosdo passado e a sensibilidade de quem olha e estudacom os olhos de hoje, para produzir algo novo quecontenha a atmosfera e o valor do patrimônio doqual partiu.”“Os objetos são asmemórias materiais deuma rede de relações,interesses e ideias: porisso o valor está napossibilidade de reconstruira rede que os produziram,comercializaram,comunicaram e utilizaramesses artefatos, paracompreender seu signicadocultural, tanto ontemquanto hoje.”- Marco RendinaMODA E PATRIMÔNIO27

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“Por isso o Made in Italy éabsolutamente identicativoe é protegido. Falar dedireito da moda serve paracolocar os pingos nos issobre todos os instrumentosque são necessários paraa proteção dos assetsmateriais e imateriais dosquais a indústria da moda écomposta.” - Silvia Segnalini.é o maior ativo que uma marca ou criador podemter atualmente, ainda que a propagação de estilosseja central para a moda. Esse paradoxo motivaesta edição da Unsatisfashion, que se propõe areetir sobre três nuances da originalidade que seacentuarão num futuro próximo: como propriedadeintelectual; como propriedade industrial e comopatrimônio cultural.SER ORIGINALEmbora  a  palavra  originalidade  seja  muitasvezes confundida com criatividade ou até mesmocom novidade, seu sentido é outro. Ela quer dizerque  um  artefato  tem  pertencimento  –  se  originaem algum lugar ou por alguém -, e que, portanto,carrega em si as qualidades materiais e imateriaiscaracterizadoras de sua origem.  Por essa razão,os termos patrimônio e propriedade denem comperfeição o que eles protegem, que é, justamente,a identicação de origem e não exatamente algo.Mas  a  preocupação  em  proteger  a  moda  ébastante recente. Em entrevista à Fashion SchoolDaily, Susan  Scad,  a precursora  no  direito  damoda, armou  que a  moda, considerada frívolae  feminina,  foi  deixada  de  lado  no  âmbito  daproteção  legal  e  moral  durante  muito  tempo.Recentemente, com o crescimento da economiada cultura -  que é  a base sobre a qual  bens não-materiais adquirem valor de mercadoria -, abriu-se espaço para discutir o tema.A moda entrou nesse campo devido à potênciado  setor,  que  desfruta  de  enorme  crescimentoproporcionado  pela  Internet,  como  salientaEleonora Carrillo,  advogada  especialista em trademark e  Diretora Geral  da Jacobacci &Partners  na  Espanha.  Desde  seu  ponto  de  vista,“a enorme expansão dos produtos baratos trouxecomo consequência a necessidade de diferenciaçãodos produtores e criadores que verdadeiramenteinovam e lideram o mundo da moda e que, portanto,não  competem  no  preço,  mas  na  qualidade  eoriginalidade.” O mundo digital tornou mais fácilcopiar velozmente e mais difícil para o consumidordiferenciar a origem dos produtos.Mas  a  moda  está  se  desmaterializando  etornando  mais  complexo  o  equilíbrio  entre  aproteção e o acesso. Atualmente vai além dos bensde consumo, alcançando o turismo, a publicidade,os eventos, a comunicação e a produção cultural.Está  presente  nos  livros,  lmes  e  exposiçõesem  museus,  sendo  intelectualizada  e  ganhandorespeito.  Além  disso,  é  atravessada  por  todas  asdemandas  sociais  contemporâneas  e  tem  umapenetração social nunca antes vista. Por meio dela,falamos com muitos públicos.Observamos  então  que  sua  proteção  legal  emoral respondem ao valor que a cultura de modatem em um determinado contexto. Na Itália, porexemplo,  é  clara  a  sobreposição  de  ambos  osconceitos: “se trata  de  uma  indústria  importanteque se caracteriza tanto no nível cultural quanto deestética e de números”, salienta Silvia Segnalini,advogada  especialista  em  bens  culturais  epesquisadora da Università Sapienza di Roma.Na página ao lado, conjunto John Galliano para Dior de 1997,Coleção Francisco Capelo no MUDE em Lisboa.

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Montanha de tênis falsificados no camelô30AS NUANCES  DA  CÓPIA NA  MODATravestida de tendência ou referência, a cópiana  indústria  da  moda  é  um  assunto  repetitivo.Condenada  por  nossa cultura,  a  cópia  nos  afetaporque denuncia nossa incapacidade para criaralgo novo. O  problema,  então,  não  está  na  cópiaem si porque o produto copiado pode não ser piorque o original, mas nas razões que levaram a ela.Do ponto de vista legal, embora diferentes paísessejam unânimes ao proteger as marcas comerciaiscomo  signos  distintivos  da  origem  dos  produtos,atribuir  propriedade  legal  aos  aspectos  formaisdos  produtos  é  mais  complexo.  Como  salientaKal Raustiala, professor na faculdade de direito da  UCLA  em  Los  Angeles,  pelo  menos  nos  EUA  “a  originalidade  do  produto  tem  uma  relevânciamuito  baixa  legalmente”  e,  inclusive,  muitosprojetos  são  de  domínio  público.  Assim,  emboraos  prejuízos  das  empresas  que  tiveram  suascriações usurpadas sejam notáveis, a propriedadeindustrial tem seu alicerce na proteção doconsumidor, evitando  que ele se confunda:  issopoderia ocorrer se a identidade visual das marcasse  assemelhasse  ou  se  os  produtos  em  disputapossuíssem características estéticas similares.Apesar  de  ilegal,  sabemos  que  produtosfalsicados  e  que  imitam  descaradamente  asmarcas mais famosas existem. Silvia Segnalini salienta que se trata de “um tráco organizado emnível internacional” que se desenvolve de modosdiferentes  de  acordo  com  a  zona  geográca.Segundo  a  especialista,  a  clientela  europeiaestá  um  pouco  “saturada”  desses  itens  muitopirateados e têm procurado outras marcas elogos, mas, em outras zonas, as cópias atendem odesejo de status social.Mas  se  a  pirataria  é  a  forma  mais  evidentee  indiscutivelmente  ilegal  da  cópia,  outrasformas imorais, mas  mais difíceis  de controlar,se  desenvolvem.  Encontramos  exemplos,como aponta Eleonora Carillo,  como  “atos  de imitação  ou plágio  maissutil dos próprios criadoresentre si, como fica claro nasinfluências dos criadores líderesda moda internacional e que sãoidentificadas, por exemplo, nasgrandes cadeias de distribuição.”

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31Segundo a especialista, enquanto a falsicaçãoagrante possui um marco claro de proteção, nascadeias de fast-fashion “a imitação sutil é pensada,precisamente, para burlar essa proteção”.A aplicação de leis de proteção na modaenfrentam diculdades especícas e, segundo Kal Raustiala, embora nos EUA as leis de propriedade intelectual  sejam  bem  efetivas  no  âmbito  dasmarcas e de algumas patentes, o design das roupasnão pode ser protegido:“a maioria dos designspodem ser copiados nos EUA, efrequentemente o são, levandoa  uma  grande  produção  decópias dos produtos maisdesejados. Em contrapartida asleis estadunidenses protegem nãosó logotipos e outros sinais, mastambém  embalagens  e  tudo  quepossa ser englobado no conceito detrade dress.”Mas uma terceira e cruel nuance da cópiana moda – e presente não só nas cadeias de  fast-fashion ou marcas populares, mas também nas marcas de luxo –, é o que se chama de apropriaçãocultural. Talvez, possamos até mesmo considerá-lapior, pois, travestida de homenagem ou inspiração,está internalizada no comportamento de algunsprossionais de criação. Para que não reste dúvida,esclarece Brigitte Vézina, “apropriação  cultural  é  o  atorealizado  por  um  membro  que  éparte de uma cultura relativamentedominante, ao pegar umaexpressão cultural tradicional erepropor em diferente contexto,sem  autorização,  conhecimentoe  ou  compensação,  de  modo  acausar prejuízo aos proprietáriosda expressão cultural.”Para  combater  esses  casos  se  faz  necessáriauma mudança mais profunda no comportamentodos responsáveis pelas coleções. Um bom modelode proteção, segundo Brigitte Vézina, “poderiase  inspirar  nos  direitos  de  copyright  moral,  como  objetivo  de  preWservar  a  honra  e  a  reputaçãode povos nativos, mantendo a integridade de suacultura  e  assegurando  a  adequada atribuição  depropriedade.”QUER SABER MAIS?Eleonora Carrillo  é  Managing  Partner da  Jacobacci  &  Partners  em  Madri.Advogada especializada em trademark comatuação  internacional,  é  responsável  peloprojeto  de  expansão  do  seu  escritório  naAmérica  Latina.  Fundou  o  LATAM  Desk,que fornece assistência especial para seusclientes com negócios no continente.Kaul Raustiala é  professor  na Faculdade  de  Direito  da  UCLA  eespecialista em propriedade intelectuale leis internacionais. Em coautoria comChris  Sprigman  da  da  NYU,  publicouThe  Piracy  Paradox:  Innovation  andIntellectual Property in Fashion Design eThe  Knocko  Economy:  How  ImitationSparks Innovation.  Pesquisa  também  a IG, trademarks, e a proteção do patrimôniocultural.Silvia Segnalini é advogada e professora na  Università  Sapienza  di  Roma.  Suaespecialização é o direito da arte, da modae  dos  bens  culturais.  Seu  livro  Le leggi della moda, trata de aspectos jurídicos do sistema moda por completo. Atua comomentora  jurídica  do  Fashion  Trust  daCamera Moda Milano, atendendo questõesdos designers emergentes.Brigitte Vézina  é  advogada internacional no campo dopatrimônio,  propriedade  intelectual,  copyright  e  trademark.  É  expert  emnegociações  internacionais  para  aproteção da propriedade intelectualde  expressões  culturais  tradicionaisna indústria da moda. É Open PolicyManager  na  Creative  Commons  ebolsista  no  Centre  for  InternationalGovernance  Innovation  (CIGI).  Asopiniões  de  Brigitte  Vézina  expressaem essa  matéria não  necessariamenterepresentam o ponto de vista daCreative  Commons  ou  de  qualquer  deseus clientes ou relações profissionais.

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CONTEÚDO DE MODADE QUALIDADEULTRAPASSEA FRONTEIRAwww.fashion-for-future.com    @fashion.for.futurePARTICIPE DAS AULAS AOVIVO GRATUITAS NO